domingo, 16 de março de 2008

Heroísmos artificiais (esboço)

O primitivo nunca nos foi privado. Nunca foi privado.
Ardo. Cardíaco. envenenado. elemoníaco.
O que escrevo é digno de ser lido? Selado? Velado?
O que escrevo tem cheiro. Cheira. é cheio. e é também vácuo.
feito fogueira forte...sou os galhos secos crepitanto (verdes?)... estalos secos, altos : largos.
Eu quero te contar o que sinto. Minha tensa intenção tesa. Falo de pêlos e pele eriçados. Falo de falo e de carne, porque rejeito a sublimação. Não sou etéreo, sou éter. A nódoa não me abrevia; amplia as vias de vida.
Minha precisão é imprecisa. Cisão com o discurso pragmático dos passantes.
Quero te dizer da minha infância. Pois tudo teve um começo (teve? há também o eterno. o que é um mistério corrosivo inexplicado.) Quero com a voz de adulto corporificar o abstrato da infância. informulável. Quero falar do que me foi interdito/ o que ficou sufocado. Meus olhos oblíquos quase envesgados foram torturados... derramaram grosso sal sob osol sobre as minhas retinas.,] Eu não podia dormir na escuridão. O breu me estonteava. Urdia a artificialidade da luz desnudando o espaço. Meus ouvidos zuniam e a noite era um bicho me bicando o intestino. Como pude envelhecer até uma adolescência, ninguém poderá suspeitar.
(eu sou a minha infância que envelheceu, envilecida)
jogo com amor a minha mão crescida de longos dedos masculinizada por veias salientes para uma mão pequena e branca de criança.
Pois tudo teve um começo. E o meu início foi fosco. Foi fossa triste.Tão escura. Povoada de ratazanas gordas. roendo, roendo, roendo. não mais dói. escuto-me. Eu me arrepiava de medo do que o escuro escondia. por isso, sempre tive amor às luminiscências. Teu olhar claro me transita, ilumina-me... ( com teus olhos consegui me enxergar. foi miraculoso, como nas parábolas. mas não fabulo, apenas digo.) é carícia isso que digo? é pouco inteligente?
fui uma criança solitária. triste. Ainda o sou. Só que antes eu era mais. Advertência intermitênte: o pestanejar de sílabas não me seduz mais. Reduzi-me a ele por subjetivo gosto. Agora experimento com gula a ruptura com essa coagulação do pensamento. Subescrito-me com tenra dureza. Rijo fixo o que quero dito. E tresdigo-te. embora isso seja maldito ( ... ) eu pedia um irmão quando era pequeno. não era um irmão que eu queria, compreende o que isso protege? Não sou implícito. Entretanto, sou um mistério para mim mesmo e me angustia ouvir-me tão difusamente. sou evidente em indícios e não minto. sou verdadeiro e inconcluso, porque estou em uso. Não posso ser categórico. O Absoluto não existe. Por que sei disso apodreço depressa/ petrifico meu pensamento antes que ele desapareça. Estou morrendo.
Não demonizo, simplifico ou personifico a morte. Única garantia da mortalidade. A morte é vida transcorrendo, gastando-se. Jamais revoltaria-me contra a morte. A morte é a vida sendo em movimento.
Movimento meus dedos lentos lânguidos largados trêmulos tocando o áspero da tua barba... cerro os olhos... enxergo como os cegos, com a inaptidão que as pontas dos dedos tem para a visão. [ lembro de Tirésias, sábio e profético: cego] ... é com timidez e desejo - sangrando,sagrado- que desmaio meus dedos com agrado no duro dos teus pêlos.
------
sou um feixe de nervos recebendo choques.seiva bruta inlapidada. inocente.
beijo a tua inocência com respeito.
venero teu veneno.
quero a dose letal.
admito e admiro a fatalidade.
à beira do abismo, não me abismo. sou obstinado, meu fígado figurado. Rabisco à giz. risco-nos à cera, rindo. estou sozinho com um pedaço teu dentro de mim. Fagulha me incendiando.
sou ínfimo para suportar essa centelha tua que me pesa por ser demoníacamente alegre. gritante. cresce.

Nenhum comentário: